Uma das diferenças, sintomática, entre uma língua com estado e uma língua sem estado é a ligação desta última com as percentagens. Para já, quantas pessoas a falam, a escrevem, a entendem, acham bem ou mal que se promova socialmente e mil e dous itens mais. Para as línguas com estado, no mínimo naqueles territórios onde é hegemónica, o esquema é outro. Nem sequer interessa demasiado quantos emigrantes a assumem porque, tarde ou cedo, vão ter de a assumir ou se tem muito ou pouco peso na produção científica porque os cientistas são quatro gatos pingados.
Que percentagens de horas escolares devem ser em galego para “colaborar” a que os alunos e alunas galego-falantes conservem a língua transmitida polos seus pais? Relativamente ao ensino, só serve 100%.
Na Galiza a presença das percentagens tem especial relevância no quadro do ensino obrigatório. Pense-se nos mantras 50% e 33%. A este respeito existe uma pergunta incontornável que devemos responder: que percentagens de horas escolares devem ser em galego para “colaborar” a que os alunos e alunas galego-falantes conservem a língua transmitida polos seus pais?
É certo que existem muitos fatores, para além do ensino formal, que incidem na língua da miudagem e da adolescência. Ora, relativamente ao ensino, só serve 100%.
Como se sabe, é a conclusão a que chegaram na Catalunha ou em Castela. Em ambos os territórios aplica-se a chamada imersão linguística, sem limite em Castela e com limites crescentes na Catalunha. Na verdade, chegaram à mesma conclusão numérica em mais sistemas educativos, como é o caso do basco e do valenciano, mas as suas elites não aplicaram. No caso basco optaram por um sistema de três vias, euskera como língua veicular, castelhano como língua veicular e um misto de 50%. Das três vias, só a primeira garante um desempenho alto nas duas línguas oficiais, talvez por isso seja a mais solicitada, por volta de 70%. No caso valenciano, por sua parte, optaram por duas vias, uma em catalão e outra em castelhano.
Valência e a Galiza têm um ponto em comum a respeito do País Basco e Catalunha. As suas elites são nacional-espanholas, portanto aspiram a formar cidadãos espanhóis
Valência e a Galiza têm um ponto em comum a respeito do País Basco e Catalunha. As suas elites são nacional-espanholas, portanto aspiram a formar cidadãos espanhóis. É o natural. Valência, como a Galiza, tem duas línguas oficiais mas a sua gestão não é um jogo de toma cá, dá cá com %. Os progenitores que falam catalão e querem transmitir a língua aos filhos podem escolher, durante o dilatado governo do Partido Popular nem sempre, um sistema educativo 100% na língua própria.
Este sistema de vias é poderoso porque permite reunir alunos que falam uma língua menorizada em lugar de os diluir. Pensemos nas cidades e muitas vilas galegas. A língua dos iguais tem um peso relevante nos usos linguísticos das crianças e os adolescentes. Nos adultos também mas sempre está mais aberto a exceções.
Perante o silêncio da religião, o sistema educativo galego é uma máquina quase perfeita de criar cidadãos espanhóis que se expressam em castelhano
Na Galiza, infelizmente, este debate não fai parte dos debates possíveis porque está barrado por algum dogma de fé. O ensaio-erro ainda não está generalizado no terreno da planificação linguística. Perante o silêncio da religião, o sistema educativo galego é uma máquina quase perfeita de criar cidadãos espanhóis que se expressam em castelhano. Eu sei, os do PP são muito maus, são o diabo mesmo, mas porque se facilita tanto o seu labor? Por que não experimentamos novos caminhos?
O número que fai parte do título deste artigo, 38, é a percentagem de alunos e alunas que estudarão na via em catalão no presente ano letivo.