Catalunha: a via fiscal à independência

Há algo de chocante na irrupçom do agrávio económico como eixo do discurso independentista catalám. Lembra-nos aquela ironia: se pensas em sexo, por que falas de amor? O discurso nacional catalám afincou sempre na memória histórica e na irrefreável vocaçom regeneracionista sobre o Estado, atrasado, centralista e ineficiente. Assistimos agora ao processo de transformaçom do som i serem gent catalana tant si es vol com si no es vol, proclamado na sardana patriótica de La Santa Espina, na complexidade do cálculo tributário da mao dumha crise que ameaça já o consenso constitucional. Dá que pensar a coincidência no mês de setembro da grande manifestaçom cívica de Barcelona em demanda de independência e trato fiscal preferente e a de Madrid em contra de um Parlamento denunciado como alheio à angústia social provocada pola crise.

A história está repleta de resistentes numantinos mas apenas registra casos de heroísmo épico por causa do défice fiscal a nom ser o no taxation without representation que converteu às colónias británicas nos Estados Unidos de América

Está por ver se a nova linha argumental do independentismo catalám pode paragonar-se em potência mobilizadora com o som i serem. A história está repleta de resistentes numantinos mas apenas registra casos de heroísmo épico por causa do défice fiscal a nom ser o no taxation without representation que converteu às colónias británicas nos Estados Unidos de América. O número nom pode competir com o símbolo em capacidade mobilizadora. Dá pouco jeito para a arenga.

Além das reservas que concita a metodologia das balanças fiscais e as conclusons que delas pretendem tirar-se, o discurso económico-soberanista dista de ser indiscutível. O pretenso espólio fiscal há de ser de confrontado com dous contra-argumentos de peso. Um de carácter político, referente ao imperativo de equidade social, e o outro económico, de índole estritamente mercantil. O primeiro contra-argumento rechaça como falaz o próprio fundamento da questom: o contribuinte é sempre umha persoa física ou jurídica, cidadao ou empresa, nunca um território. Um operário, um empresário catalám suportam cargas tributárias idênticas às dos seus congéneres estremenhos. A única diferença estriba no facto de Catalunha contar com bases impositivas maiores. Em outras palavras, tributam as carteiras, cobram os cidadaos; aquelas som diversas, estes iguais. O segundo contra-argumento é muito mais rés-do-chao.

As direitas nacionalistas que decidam optar pola via independentista vam ter que confrontar-se com a dupla presom do independentismo popular de esquerdas -ERC, Bildu- e a xorda reserva das círculos empresariais, pouco amigos da inquietaçom social

Confirma que Catalunha arrecada mais do que recebe por via fiscal mas recorda que também vende mais do que compra no resto de Espanha, circunstáncia que lhe permite suster o seu nível de demanda e actividade económica: défice fiscal, superávit comercial. Escusado apontar que o primeiro argumento é o preferido pola esquerda e que o segundo forma parte do argumentário da direita e o cerne das convicçons mais firmes dos círculos empresariais. Coesom, federalismo solidário... argumentam os primeiros; unidade de mercado, eliminaçom de fronteiras...clamam os segundos. As direitas nacionalistas que decidam optar pola via independentista vam ter que confrontar-se com a dupla presom do independentismo popular de esquerdas -ERC, Bildu- e a xorda reserva das círculos empresariais, pouco amigos da inquietaçom social e menos ainda de polémicas que podam afectar à actividade comercial. Um autêntico desafio estratégico.

Umha das últimas e talvez a mais equilibrada das avaliaçons efectuadas das balanças fiscais territoriais foi a elaborada por Pedro Solbes por mandato parlamentário. Foi publicada no 2008 a partir de cifras do 2005. Sem entrar em detalhes técnicos e critérios de imputaçom -tam importantes para a correcta interpretaçom dos resultados- o quadro resultante é fácil de resumir. Catalunha, Madrid e as Ilhas Baleares contribuem polo 25%-30% do seu PIB e beneficiam-se em menor medida, cedendo em consequência um diferencial estimado do 7% ao 9% do seu PIB segundo critérios. Estimaçons recentes da Generalitat -nom exentas de objecçons- cifram o défice tributário do 2009 -nom confundir com o défice orçamentário- no 8,4% do PIB catalám: 16.400 milhons de euros resultantes de deduzir dos 61.800 milhons de carga tributária suportada 45.400 milhons de retornos recebidos pola comunidade. No extremo oposto do espectro fiscal estám as comunidades com bases imponíveis insuficientes para cobrir as competências estatutárias exercidas no contexto do quadro de financiamento em vigor. Estremadura é o caso extremo da dependência enquanto Galiza se veria favorecida polo 6,75% ao 8,20% do seu PIB segundo o informe Solbes: 3.000 a 4.000 milhons por ano.

Catalunha arrecada mais do que recebe por via fiscal mas recorda que também vende mais do que compra no resto de Espanha, circunstáncia que lhe permite suster o seu nível de demanda e actividade económica: défice fiscal, superávit comercial

O desequilíbrio fiscal experimentado pola comunidade madrilenha nom é menor que o catalám mas nom provoca sentimentos de agravo. É a diferença existente entre comunidades históricas e agregados sociais. Mistério insondável para escépticos em matéria de identidades colectivas e bom tema de reflexom para os entusiastas do café para todos.

A mobilizaçom massiva do 11 de setembro em Barcelona revela um profundo mal-estar claramente ancorado na desesperança económica e a frustraçom suscitada pola desqualificaçom do Tribunal Constitucional ao texto pactuado para a reforma estatutária catalá. Lembram a mobilizaçom galega da aldraje?, voltará, em Catalunha está pleno vigor.

A manifestaçom barcelonesa sumiu à opiniom pública espanhola em estado de choque, e contodo... quem pode negar o direito da sociedade catalá a debater a via independentista se essa for a sua determinaçom democrática? Evocam-se casos como o do Estado Livre Associado de Porto Rico ou cenários pós-unitários como os que apontam em Quebec e Escócia. No processo que agora pom em marcha a convocatória a urnas em Catalunha só um requisito deveria ser respeitado: a exigência de seriedade no debate, de afastá-lo da demagogia partidária e a argumentaçom tortuosa e parcial. O debate social há de desembocar em consulta clara, inequívoca e vinculante; sem dramatismos. Em perspectiva histórica nom podemos furtar-nos a ideia de assimilar o processo em curso ao proceloso mas inexorável avanço da Uniom Europeia em detrimento dos Estados nacionais. O autêntico perigo a conjurar neste processo é a substituiçom das aspiraçons colectivas -cuja dimensom está por avaliar- por interesses oligárquicos ou aventureirismo político. Patriotismo da Padánia.

O autêntico perigo a conjurar neste processo é a substituiçom das aspiraçons colectivas -cuja dimensom está por avaliar- por interesses oligárquicos ou aventureirismo político. Patriotismo da Padánia

Um milhom de cidadaos na rua nom se podem ocultar com silêncios administrativos e argumentos especiosos de oportunidade e inoportunidade. A Gram-Bretanha dispom-se a um referendo de independência em Escócia sem aparente desgarro. Em democracia os problemas políticos se curam com política. E nesta, a virtude da prudência é incompatível com o temor. A argumentaçom pública e descontaminada -o grande invento dos gregos- é a melhor defensa contra as inevitáveis artimanhas interesseiras. É preciso reconhecer os signos de esgotamento que afligem à admirada transiçom espanhola e à sua generosa multiplicaçom de autonomias. Argumentos e argumentadores ham de competir agora na ágora. Há-os bons na bancada crítica com a aventura independentista, como os Ruiz de Soroa, Angel de La Fuente, Josep Ramoneda ou Vidal Folch. Mais difícil é achá-los no campo independentista.

A Gram-Bretanha dispom-se a um referendo de independência em Escócia sem aparente desgarro. Em democracia os problemas políticos se curam com política

O espectro de soluçons está demasiado como também o limite entre o desejável e o conveniente: federalismo assimétrico? Estado confederal com devoluçom total ou parcial de competências por parte de algumhas comunidades? Promoçom de referendos de independência vinculantes? Talvez convenha lembrar que una miqueta d'independència nom parece viável, em opiniom de Ruiz de Soroa .

O nacionalismo galego deve preparar-se para entrar no debate

O nacionalismo galego deve preparar-se para entrar no debate. Interno primeiro, público e aberto à sociedade despois a menos de renunciar à necessária à formulaçom do discurso soberanista de Galiza. Pouco valor vai ter a glosa ao Sempre em Galiza, os tempos som outros. Com vocaçom integradora e amistosa mas com formulaçom inequívoca capaz de reverter a indigna posiçom adoptada pola direita galega que por boca do senhor Feijó propugna abertamente a jibarizaçom da autonomia mediante a reducçom da sua cabeça parlamentária. Um troféu para Madrid. Galiza nunca vai transigir com qualquer trato diferencial em favor de Catalunha e do País Vasco. Concitar o máximo apoio social em prol de maior e melhor autogoverno é a tarefa imediata do nacionalismo. Para isso vai ter que mudar de modos, de estilo organizativo e de dogmas. Há de revisar a sua ortodoxia, e também a sua ortopraxe.

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