De símbolos e discursos

O 15 de Janeiro do 2012, morria no seu domicílio madrilenho dom Manuel Fraga, 89 anos, presidente da Junta da Galiza durante quinze anos decisivos: 1990-2005. Antes fora Ministro de Información y Turismo (1962-1969) de Francisco Franco e antes ainda opositor aplicado e catedrático precoce. O ilustre político espanhol descansa agora na paz marinhá do cemitério de Perbes detrás de umha lápida sepulcral que reza: “Manuel Fraga Iribarne, + 15-1-2012, Bo e xeneroso”. O singular epitáfio pretende reduzir a vasta trajectória do impetuoso progenitor da direita espanhola à simples condiçom de modesto cidadao de acrisolada fidelidade ao país que o viu nascer e que chegou a presidir com ímpar dedicaçom e mínimo compromiso com a sua entranha histórica e simbólica. Essa entranha que agora reivindica a lápida sepulcral que preside a sua última morada. O Fraga do cemitério de Perbes, despojado das inúmeras medalhas e honores que o acompanhárom em vida, descansa agora como honesto patriota galego.

Nom há que esforçar-se muito para adivinhar o amplo sorriso irónico com que terá saudado tam ingénua transmutaçom o perspicaz olho de vidro de Castelao desde o seu entranhável refúgio de Bonaval

Nom há que esforçar-se muito para adivinhar o amplo sorriso irónico com que terá saudado tam ingénua transmutaçom o perspicaz olho de vidro de Castelao desde o seu entranhável refúgio de Bonaval. Ele si, bom e generoso de raiz, que transitou os caminhos da vida sem uniformes nem medalhas nem mais título de honra que o de artista do seu povo e notário meticuloso das suas mais íntimas aspiraçons e carências.

A lápida de Fraga, a bandeira que envolveu o seu féretro, som umha inesperada homenagem de reconhecimento da arrogante retórica do nacionalismo espanhol à modesta semiótica do nacionalismo galego.

O nosso é um nacionalismo rico em simbolismos e o símbolo, o signo, a base da comunicaçom. Somos animais simbólicos, já é sabido, e a potência do signo supera à do abstracto raciocínio

O nosso é um nacionalismo rico em simbolismos e o símbolo, o signo, a base da comunicaçom. Somos animais simbólicos, já é sabido, e a potência do signo supera à do abstracto raciocínio. Sabem-no os economistas quando falam de activos intangíveis ou de valor de marca -Zara, Pescanova, Citroën mesmo- que outra cousa nom som que signos para diferenciar o genuíno do sucedáneo.

Umha questom, a propósito: como é que o nacionalismo galego, com tam rico acervo simbólico, nom é capaz de fazê-lo valer para avançar em reconhecimento social? Se o nacionalismo possui tam reconhecida e imitada marca de qualidade, porque é tam estreito o seu mercado?

A questom remete a um assunto crucial do pensamento político, o da hegemonia (Gramsci): a capacidade de persuasom social que qualquer organizaçom há de projectar para conquistar e preservar o poder político. Se tivéssemos que atribuir a um motivo principal a manifesta incapacidade do nacionalismo galego para seduzir a consciência social do país, eu apontaria sem vacilar cara à pobreza e desactualizaçom do discurso político que vem practicando. Preso de ideologias inoperantes e ressessas, o nacionalismo operante, o BNG, pouco mais pode oferecer à sociedade que tenta dirigir que os veneráreis símbolos da pátria.

Preso de ideologias inoperantes e ressessas, o nacionalismo operante, o BNG, pouco mais pode oferecer à sociedade que tenta dirigir que os veneráreis símbolos da pátria

O código genético que constitui o BNG amostra-se incompatível com a Uniom Europeia, com a autonomia política, com as políticas social-democratas (há outras?), com o direito à diferença dentro do próprio nacionalismo. Desconfia e tenta tutelar toda iniciativa da sociedade civil. Rechaça, em definitiva, o presente imperfeito em favor do futuro perfeito para acabar resignando-se ao tempo subjuntivo. Os filósofos falam de cote da crise do gram relato; a sociedade enxordeceu para as grandes palavras que som as que sustentam os grandes rechaços.

Os partidos com sede madrilenha nom precisam de muito discurso, abonda-lhes com a argumentaçom da diferência e a alternáncia além de contarem com a potente megafonia da imprensa diária e os meios de comunicaçom. O nacionalismo nom, o nacionalismo precisa fornecer generosas doses de pedagogia, defender a qualidade sobre a quantidade, oferecer um horizonte de facticidade, cultivar a diferença, anunciar a Galiza intercontinental. Demasiada tarefa para tanta unanimidade como se cultiva e se exibe.

Os partidos com sede madrilenha nom precisam de muito discurso, abonda-lhes com a argumentaçom da diferência e a alternáncia além de contarem com a potente megafonia da imprensa diária e os meios de comunicaçom

Os bons e generosos disponhem dum riquíssimo património simbólico que ham de devolver à sociedade porque está em empréstimo. Também ham de escrever o discurso actual e necessário liberando-o do discurso ritual e reprimido que o está afogando. A razom é que nos negamos a ser outra naçom falhada.

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