“Aquelas festas, onde os ricos son espectadores!”

Dificilmente poderia imaginar Guy Debord até que ponto o progresso confirmaría as suas teses d’A sociedade do espetáculo; hoje, mais do que nunca, a vida afastou-se em forma duma representação. As novas tecnologias atomizaram a sociedade numa multidão de individuos, solitários mas juntos, que autorretransmitem em tempo real a sua vida para ninguém; o paradoxo dum solipsismo hipercomunicativo. “Ninguém baila, mas todos somos DJ’s”, dizem polos centros sociais madrilenos.

A propósito da televisão, Günther Anders descrevia com tristeza como a mesa, esse pequeño espaço domêstico para a convivencialidade alimentar, foi rota polo novo invento, ficando os comensais juxtapostos como num pelotão de fusilados polos raios catódicos. Rompia-se o círculo democrático para impor uma tiránica unidirecionalidade. O mesmo sucedeu nos torreiros da festa das paróquias galegas. Uma tomada cinematográfica de longuíssima duração mostraria a passagem dum círculo comunitário –bailes em roda, interações coletivas e múltiplas- a um pelotão de espetadores de orquestras. Há uns anos, numa reunião do clã das Brá, na Espenica, as matriarcas criticavam as novas orquestras, a transformação do festeiro em espetador, e a barreira que impunham uns palcos gigantescos. “A mim não che me ghustam nadita, essas são-che orquestas pa mirar, não pa bailar. Parecemos parvos pasmando cara elas”; “Aghora não há a diversão que havia antes, aquela aleghria. Aghora vás ao campo da festa pa mirar pa televisão”. As festas tradicionais eram teatro espontâneo no que todo o mundo era ator e atriz; a passagem a umas festas espetacularizadas, que separa a gente em protagonistas e espetadores, gerou uma resistência popular, especialmente intensa nas zonas de grande tradição entruidesca. Em Ginzo e Verim, onde já tradicionalmente as pantalhas e cigarrões tinham a função policial de perseguir os espetadores, a turistificação e programação do Entruido a partir dos anos 80 provocou uma forte oposição.

É fascinante ver como Castelao sentia as relações de poder nas festas populares no desterro espanhol, e via nas galegas um espaço de dignidade popular: “Eiquí a plebe non desperta con dianas e alboradas. Eiquí non hai foguetes, nin globos, nin gaitas, nin charangas, nin bailes populares. Nin tan sequera hai xigantes e cabezudos. ¡Ouh, aquelas nosas festas, onde os probes gozan máis que os ricos, porque aínda teñen inocencia de abondo para divertírense con honestidade…! ¡Aquelas festas, onde os ricos son espectadores!”.

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