Marusia na maré

Observamos a enchente da maré ao tempo que antecipamos o seu devalo. A causa estriba na extrema dificuldade de fusionar correntes tam discordantes como as que confluem na enchente, a começar pola difícil convivência de genética nacionalista e a hispano regeneracionista. Castelao e Azaña de maos dadas é uma reconfortante miragem, mas provavelmente fugaz.

Na generosa enxurrada da maré todo cabe mas também partilha umha consciência bipolar: de umha parte: a constelaçom nacionalista em volta de Anova, da outra, a potência convocatória de Podemos. O resto na maré, permitam-me a afirmaçom sem ánimo denegridor, tem algo de excipiente saborizante.

A fenda patriótica latente multiplica-se quando consideramos a difícil convivência das tradiçons em confluência. Europa, si ou nom; social-democracia ou comunismo, democracia plebiscitária ou representativa... Por nom falar já das disjuntivas provenientes da gestom do quotidiano e as inevitáveis limitaçons orçamentares que comportam. A realidade e o desejo som pulsons mal avindas. A amálgama ideológica que alimenta a maré é um meio óptimo para acelerar a fermentaçom da massa mas péssimo para a sua estabilizaçom.

A maré e os seus parceiros por Espanha adiante experimentam com variada intensidade a inevitável tensom política centrípeta/centrífuga. O conflito modula-se em cada território segundo a correlaçom de forças e figuras. Comparem os pares [Anova/Beiras] com [Barcelona em Comú/Colau]. O papel d@ protagonista é sempre essencial na interpretaçom do texto e do contexto.

Nos comícios gerais agora à porta, as cartas estám repartidas e previstos os resultados, mas nom as consequências. O cenário madrileno refractará-se depois em sucessivos conflitos periféricos e a permanente questom [centro ↔ periferia] ressurgirá nos sucessivos confrontos eleitorais. Na Galiza, no dia 20 de novembro talvez, em memória do finado aquele de Ferrol que já ninguém lembra.

O teste autonómico será revelador. Podemos, tentará consolidar-se como força política autónoma e definitiva no espaço político galego ao tempo que a coaligaçom das marés que lhe serve de suporte haverá de submeter-se a um severo stress test de incertas consequências.

É de justiça honrar o positivo contributo das marés e as suas parcerias à divulgaçom e reactivaçom da singularidade nacional da Galiza e da questom da “fronteira interior”. O assunto é: alguém pode avaliar o grau de compromisso da força aglutinante (Podemos) na agenda plurinacional, excessiva sempre para uns e mesquinha para outros?

A componente nacionalista que articula a presença de Podemos no país, chamemos-lhe marusia –mar rijo ou picado: Estraviz – está obrigada a arranjar de imediato um difícil modus vivendi que garanta e pondere simultaneamente a presença parlamentar das forças confluentes e a sua própria identidade.

Anova e os planetas menores em volta verám-se forçados a explorar a possibilidade de cooperaçom com o BNG sob pena de invisibilidade e irreleváncia. A experiência AGE contém algumha liçom ao respeito. O papel de avalista é inevitavelmente secundário e a naturalizaçom definitiva de Podemos no país desafia o discurso da generosa confluência paritária. A essência da briga política consiste em partir o espaço de debate na disjuntiva [amigo ↔ inimigo], adverte a ciência política.

O panorama abre umha grande hipótese: a oportunidade, talvez a necessidade, de inaugurar um novo tempo no discurso nacionalista, de carácter plural, projectivo, inclusivo. O nacionalismo possível do século XXI, presidido polo inevitável princípio das “forças políticas próprias” como requisito de preservaçom da condiçom nacional da Galiza sem submetimento indevido a qualquer contrato de subarrendamento.

O obstáculo mais evidente desta perspectiva  além da inevitável confrontaçom dos relatos emancipatórios em conflito  é o do inveterado autismo ideológico do BNG. Contodo, o património político disponível do processo de convergência é tam potente que convida à máxima generosidade: legitimidade cultural consagrada, ampla cumplicidade social, abundante reserva de energia intelectual e organizativa, capacidade de reinvençóm e resistência de tradiçom já secular.

Um partido unitário e plural seria a melhor opçom, caso ser possível conjurar os delírios herdados de velhas batalhas perdidas. De assi nom ser, um pragmático reagrupamento em torno a um programa regeneracionista ambicioso e viável poderia servir de alternativa. Parece ter chegado em todo o caso o tempo de reiniciar o relato nacional, ligeiro de ortodoxias na equipagem, bem provido de generosidade cooperativa para o caminho.

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