Macrocefalia parasitária

Produción neta de electricidade en España ©

Encabeçamos esta breve revisom da índole parasitária da metrópole madrilena com umha potente infografia1 ilustrativa da voracidade energética da capital. Para a sua melhor interpretaçom será bom recordar que o índice de autosuficiência eléctrica madrilena situa-se num exíguo 4,3%, insignificáncia que nom lhe impede, dito seja de passagem, monopolizar a prática totalidade das sedes corporativas da indústria energética. Em agudo contraste, o índice alcança o valor 94,1% em Catalunha, 132,8% em Galiza — incluído o desmesurado consumo da indústria electrointensiva — e 179,7% em Castela e Leom. A especializaçom produtiva de Madrid nas actividades de serviços acentua mais ainda o espectacular desequilíbrio entre produçom e consumo eléctrico que a caracteriza.

O índice de autosuficiência eléctrica madrilena situa-se num exíguo 4,3%. Em agudo contraste, o índice alcança o valor 94,1% em Catalunha, 132,8% em Galiza — incluído o desmesurado consumo da indústria electrointensiva — e 179,7% em Castela e Leom

Devo confessar antes de mais nada que nunca partilhei essa difusa antipatia e malquerença pola capital daqueles que pretendem confundir o toucinho centralista com a velocidade cordial do convívio social. Vivim dez anos da minha vida em Madrid e as minhas vivências impedem-me abonar o persistente tópico. Madrid converteu-se, é verdade, em metáfora de poder ensimesmado, permanentemente recluso no silêncio administrativo mas, nom é legítimo atribuir-lhe mais culpas das que caiba estender a Paris ou a Lisboa. Já conhecedes a piada: –Quê país! –Qual? –Todos!

Despejados os persistentes tópicos que pretendem denegrir um Madrid zarzuelero e arrogante é o momento de denunciar sem exagero a macrocefalia parasitária que caracteriza a capital do Estado como doença progressiva e infecciosa do corpo social do país que pretende comandar. Contamos com um excelente guia interpretativo da grave disfuncionalidade degenerativa do centralismo sem ter que recorrer ao cansativo bordom das choromicadas e agravos provinciais. Falamos do documentado informe sobre a doença macrocefálica que aflige a capital elaborado polo IvieLAB valenciano: Madrid: capitalidad, economía del conocimiento y competencia fiscal2, de obrigada consulta, reflexom e memória.

Antes de procedermos a resumir o documento, é pertinente parar mentes em dous assuntos preliminares. O primeiro é o facto de o IvieLAB ser um instituto de investigaçom económica criado em 1990 pola Generalitat Valenciana, com estreitos vínculos com o sistema universitário da Comunidade e um razoável patrocínio privado. Um status que contrasta com o penoso divórcio entre o nosso poder autonómico e o estamento universitário. O presidente Feijóo faria bem em tomar nota do eco suscitado em toda Espanha da recente intervençom do presidente da Generalitat valenciana na abertura do curso legislativo no 21/09/2020: “Madrid é umha aspiradora de povoaçom, funcionariado estatal e redes de influência que provoca desigualdades em Espanha”. Declaraçom respaldada por um sólido informe, ao invés dos artifícios mediáticos tam habituais na prática política de Sam Caetano. 

A outra questom preliminar refere-se à candente actualidade do tema desenvolvido no informe do IvieLAB, que nom é outro que a nociva tendência ao parasitismo tardo capitalista que aqui conhecemos como capitalismo de amiguetes e que emana do perverso conluio entre negócios e política em prejuízo da livre competência, a equidade e o progresso. É o capitalismo clientelar de toda a vida3; da sua proliferaçom nas sociedades contemporáneas dá boa prova a sua difundida equivalência em inglês: crony capitalism4, habitual no debate social contemporáneo.

O papel parasitário da metrópole madrilena assenta no abuso da desmesurada concentraçom de poder económico que lhe outorga a centralidade, em benefício próprio e em prejuízo do resto de Comunidades

Entremos sem mais preámbulos no informe, a começar por umha sucinta descriçom da dimensom centrípeta da metrópole madrilena. Com um peso de 1,6% da superfície do Estado, Madrid concentra 14,2 % da populaçom (6,7 milhons de habitantes) gera 19,2% do PIB e ostenta um PIB por habitante equivalente a 136% da média espanhola. A sensaçom de opulência que esta situaçom alimenta, unida à persistente hegemonia do PP no governo da cidade e a Comunidade, provocou a emergência de um cantonalismo de novo cunho, desinibido e desafiante, émulo já do descontrolado estado febril que se apoderou do independentismo catalám no último decénio.

O papel parasitário da metrópole madrilena assenta no abuso da desmesurada concentraçom de poder económico que lhe outorga a centralidade, em benefício próprio e em prejuízo do resto de Comunidades. Por razom de economia expositiva resumiremos os mecanismos de acumulaçom de poder em três itens: I) Mercado de trabalho, emprego público e capital humano, II) Concentraçom de sedes corporativas e de investimento empresarial, potenciada polo carácter radial da rede de comunicaçons, e III) Abuso da capacidade normativa fiscal como engado para seduzir as grandes fortunas em prejuízo das restantes Comunidades.

I): Madrid alcançou um ritmo de crescimento do emprego que dobrou o da meia do Estado entre 1980 e 2019, muito especialmente no segmento de titulados universitários onde Madrid soube concentrar 40,9% sobre o seu censo de habitantes contra 30,8% no conjunto do país. A consequência imediata desta opulência em recursos humanos qualificados garante-lhe um status privilegiado em termos de PIB por habitante, remuneraçom, qualidade do emprego e mobilidade laboral ascendente. Drenar capital humano qualificado é um excelente negócio.

Os efeitos sobre o emprego público som especialmente patentes; o informe constata que do montante de 514.000 empregados públicos em activo, 29% desempenham a sua actividade na capital, em volta de 150.000 empregados que sobem até o meio milhom de indivíduos em termos de famílias residentes

Os efeitos sobre o emprego público som especialmente patentes; o informe constata que do montante de 514.000 empregados públicos em activo, 29% desempenham a sua actividade na capital, em volta de 150.000 empregados que sobem até o meio milhom de indivíduos em termos de famílias residentes. O IvieLAB conclui assinalando que o rácio de emprego público por habitante na Comunidade madrilena multiplica por dous a meia espanhola.

II): A concentraçom empresarial e a correspondente capacidade investidora que daí se deriva, tanto pública como privada, é um mecanismo conhecido. O IvieLAB concretiza-o em cifras: das mil maiores empresas espanholas, 44,5% tenhem a sua sede na capital e aí concentram 56% dos seus ingressos. Mais ainda, este núcleo centralizado concentra os activos empresariais tecnologicamente mais avançados e, consequentemente, o segmento de emprego mais intensivo em conhecimento. O principal mecanismo explicativo desta dinámica centrípeta reside na potente rede radial de comunicaçons de que desfruta a capital e na sua óptima conectividade aérea, tanto doméstica e internacional. A qualidade nodal de Madrid na alta velocidade ferroviária, junto com o facto de o aeroporto da capital ter absorvido 34% do investimento aeroportuário no presente século, ilustram bem às claras a magnitude do privilégio centralista.

Centralizaçom empresarial e investimento privado som magnitudes correlacionadas e, acompanhando-as, as vantagens derivadas do nexo íntimo entre fluxo investidor e capacidade decisória do poder público. Nos últimos anos, informa-nos o Instituto valenciano, o Sector Público Estatal, SPE, tem adjudicado investimentos por um volume da ordem dos 7.700 milhons de euros anuais, canalizados em esmagadora proporçom cara a Comunidade madrilena. Nada menos que 72% das mais de 10.000 licitaçons tramitadas cada ano som dirigidas a organismos localizados em Madrid e, o que é mais significativo, o seu valor alcança 87% do importe adjudicado.

III): A capacidade predatória de recursos fiscais, em benefício da elite política clientelar instalada na Comunidade madrilena, é um ponto fulcral que compendia os efeitos tóxicos do controlo do poder político de signo neoliberal que senhoreia a capital do Estado.

Madrid capital do capital, capital da jurisprudência e do poder político e, talvez mais importante, dos meios de comunicaçom que inoculam o relato hegemónico, o quadro interpretativo do que acontece, com Barcelona como frágil contrapeso. Madrid Me Mata proclamava a ironia da movida madrilena; e a quem nom?

O informe do IvieLAB sublinha com vigor o uso imoderado da capacidade normativa sobre o sistema tributário em ordem a multiplicar os benefícios fiscais a favor dos grandes contribuintes. O regulamento dos tipos aplicados ao IRPF e aos impostos de Património e Sucessons e de Doaçons para favorecer os mais afortunados sob a escusa consabida de proteger da intolerável inclemência fiscal contra os criadores de riqueza, emprego e bem-estar, a ninguém pode enganar. Foi um quadro similar a este o que levou a exclamar a François Guizot durante a monarquia burgessa de Luís Felipe, le roi des banquiers: enriquecei-vos! As consequências sociais de tal política traduzírom-se em flagrantes carências em equipamento e atençom social que a pandemia COVID-19 destapou sem aparente embaraço por parte dos agentes do espólio. Afinal, foi para bem, Madrid cresce.

Segundo o informe Ivie, Madrid deixa de ingressar cada ano 4.100 milhons de euros, equivalentes a 636 euros anuais por habitante, caso a equivalência fosse legítima que nom-na é. O mencionado regalo fiscal distribui-se entre o Imposto de Sucessons e Doaçons, 2.663 milhons, sobre o Património, 996 milhons, e em conceito de IRPF, 504 milhons. Um suculento presente que dissipa 20% da arrecadaçom potencial, ou, por melhor dizer, 25% do arrecadamento efectivo. O presidente do PP costuma alardear da sua aspiraçom a instaurar umha política fiscal similar à madrilena no conjunto de Espanha. É evidente que nos seus estudos de mestrado nom entrava a famosa falácia de composiçom que estabelece que embora se verifique que quando um indivíduo se ergue de pontas de pé em meio de um gentio amplia o seu campo de visom, a afirmaçom torna-se absurda caso se erguerem todos. O privilégio, senhor presidente, nom é generalizável, e prejudica à totalidade.

Permitam-me cerrar esta breve sinopse com um final aberto à hipótese de umha Espanha plenamente federal, afincada na sua índole plurinacional originária, com Madrid como centro extra régio e terra de ninguém, como a imaginava Agustín García Calvo no hino oficial da Comunidade

Madrid capital do capital, capital da jurisprudência e do poder político e, talvez mais importante, dos meios de comunicaçom que inoculam o relato hegemónico, o quadro interpretativo do que acontece, com Barcelona como frágil contrapeso. Madrid Me Mata proclamava a ironia da movida madrilena; e a quem nom?

Invejam os redactores do informe do IvieLAB a inteligente disseminaçom de organismos e centros decisórios do poder político alemám por todo o território federal com patentes vantagens em termos de descongestom burocrática e coesom federal, em aberto contraste com a torpe macrocefalia ao gosto espanhol. É o que temos.

Permitam-me cerrar esta breve sinopse com um final aberto à hipótese de umha Espanha plenamente federal, afincada na sua índole plurinacional originária, com Madrid como centro extra régio e terra de ninguém, como a imaginava Agustín García Calvo no hino oficial da Comunidade: Yo estaba en el medio/ giraban las otras en corro/ y yo era el centro (...) almas y massas, caen por su peso; y yo soy todos y nadie, político ensueño5. Umha irónica roda-roda ou ciranda infantil que aponta á Espanha geneticamente heterogénea e plural.

 

Notas

1 https://almacennuclear.wordpress.com/2017/09/21/madrid-sumidero-de-energia-del-resto-de-espana/

2 https://www.ivie.es/es_ES/ptproyecto/ivielab-madrid-capitalidad-economia-del-conocimiento-competencia-fiscal/

3 https://derechomercantilespana.blogspot.com/2015/09/captura-de-rentas-y-capitalismo.html

4 https://ritholtz.com/2019/03/its-not-capitalism-its-crony-capitalism/

5 https://es.wikipedia.org/wiki/Himno_de_la_Comunidad_de_Madrid

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