Paraísos reservados, beneficiários manifestos

Paraíso fiscal © https://www.plataformajusticiafiscal.com/

A fuga dos grandes patrimónios a paraísos fiscais para ocultar lucros inconfessáveis ou para evadir-se das obrigas tributárias é um fenómeno de enorme magnitude, resistente aos controles fiscais e opacos aos esforços desenvolvidos para quantificar a sua magnitude. Afortunadamente, o empenho académico por revelar e cifrar o mapa mundial do fenómeno já nos permite contemplar a sua inquietante magnitude.

Devemos agradecer aos investigadores Thomas Tørsløv (Universidade de Copenhaga), Ludvig Wier, docente na universidade californiana de Berkeley, e a Gabriel Zucman, professor na mesma universidade, o informe mais documentado até o momento sobre a matéria: The Missing Profits of Nations, publicado em 2015 e actualizado reiteradas vezes até 20221.

Para esta pequena crónica utilizaremos a versom algo anterior oferecida polo EUTAX Observatory, actualizada a 20202 que nos oferece um excelente mapa-múndi do fenómeno e documentaçom numérica congruente actualizada a 20183

O mapa interactivo cifra em 900.000 M$ o volume de benefícios transferidos a paraísos fiscais —40% da totalidade— com umha perda de ingressos tributários estimada em 200.000 M$ equivalentes ao 10% dos ingressos dos benefícios empresariais gerados. Quase um bilhom, quase um quarto de bilhom de recursos esfumados. Umha onerosa sangria detraída do gasto social —sanidade, ensino, atençom à pobreza e o desamparo—intolerável salvo para os pregoeiros de que o próprio bolso é o melhor destino dos impostos.

Porcentaxe de ingresos tributarios transferidos a paraísos fiscais © https://missingprofits.world/

No mapa referido podemos discernir o grupo de países castigados com cifras de evasom de benefícios superior ao 20% —Gram Bretanha, França, Alemanha, Hungria como mais significativos em Europa junto com os E.U.A e Uruguai em América e Nigéria em África. A seguir assinala-se um grupo, muito mais numeroso, que suporta taxas de evasom superiores ao 8% —quase toda América, Itália, Espanha, os países escandinavos, Austrália, África do Sul— e finalmente o conjunto de países que registam taxas do 4% —com a Federaçom Russa, a Índia, Turquia e Egipto como mais destacados— e os suportam umha taxa de evasom em volta do 3%, como a China e o resto dos países tam pobres que apenas som capazes de gerar benefícios.

Os países receptores dos benefícios evadidos e as correspondentes cargas tributárias constituem um enxame de minúsculos estados parasitários pintados de verde no mapa, localizados em perdidos ilhéus e prósperos portos francos de insaciáveis fauces frequentados por diligentes agentes defraudadores adeptos às estratégias corporativas de optimizaçom de resultados dissimulados em deliquescentes gabinetes de responsabilidade corporativa desenhados para a pública exibiçom filantrópica de moralidade.

A revisom da cifra de benefícios evaporados por países e das respectivas percentagens de impostos perdidos por tributaçom sobre benefícios em 2018 ficam detalhados num informe editado em 20214. Os quadros 1 e 2 do mesmo proporcionam umha imagem vívida do fenómeno nos sucessivos segmentos dos países membros da OCDE, do resto de países mais desenvolvidos e da constelaçom de paraísos fiscais receptores onde confluem as fugas tributárias.

O Quadro 1 quantifica a magnitude global do fenómeno. As cifras estimadas para 2018 som eloquentes: 946.000 M$ de lucros evaporados (35,6% do total gerado) 243.000 M$ de impostos sobre benefícios desaparecidos, 9,9% da tributaçom correspondente.

A impressionante magnitude de recursos fiscais extraviados é o resultado do incessante labor de experimentados gabinetes empresariais e umha intrincada rede de agentes intermediários em tráfico de divisas conectados a respeitáveis departamentos bancários empenhados dia e noite em canalizar a bom porto o inconfessável património de potentados agraciados polo êxito, selectas multinacionais imunes às leis tributárias e um enxame de incontrolados mandatários especializados no abuso do poder.

Na listagem dos 30 países defraudados que pertencem à OCDE os benefícios extraviados ascendêrom a 660.000 M$, aos que ha que somar os 192.000 M$ procedentes dos 16 países mais desenvolvidos que nom figuram na OCDE. Um repasso a ambos grupos revela a incidência do fenómeno entre os 46 países mais ricos do mundo.

Entre os membros da OCDE os casos mais significativos som Alemanha (83.000 M$ cedidos, 29% da arrecadaçom potencial perdida), Reino Unido (120.000 M$, 28%), França (47.000 M$, 26%), os E.U.A (186.000 M$, 23%) e Itália (32.000 M$, 20%) e Espanha (23.000 M$, 16%) etc. Espanha perde 3.700 M$ anuais de arrecadaçom tributária e atura um ritmo de fuga de benefícios de 440 M$ por semana. Está claro que nom estamos falando de pequenos empresários.

No segmento de países ricos que nom membros da OCDE, destacam os casos de Uruguai (1.000 M$, 22%) e Venezuela (1.000 M$, 16%), muito mais castigados em termos relativos que Rússia (17.000 M$, 5%) ou China (71.000 M$, 3%).

Vale a pena explorar a geografia dos paraísos receptores dos recursos defraudados, 946.000 M$ em 2018, como sabemos. Encabeçam a relaçom de países trapaceiros impunes Singapura (132.000 M$), Irlanda (126.000), o Caribe (110.000), os Países Baixos (106.000) e Suíça (102.000). Seguem-lhe as Bermudas, Luxemburgo —a virtuosa capital de instituiçons comunitárias da UE como o Tribunal Europeu de Justiça, o Tribunal de Contas e o Banco Europeu de Investimentos— com 57.000 M$ e a virtuosa Bélgica, coraçom da politica europeia, com 46.000 M$, além de Hong Kong, Porto Rico e a Ilha de Malta. As cumplicidades mantenhem-se em pudoroso silêncio.

Os procedimentos de transferência som bem conhecidos, desde a discreta mala diplomática e o inocente bolso perssoal às transferências corporativas intergrupo facilitadas quando operam em regime multidivisa. A flutuaçom dos tipos de cámbio, a compra e venda de mercadorias e os empréstimos intragrupo, o pagamento de royalties e regalias entre sucursais situados em países de conveniência som procedimentos habituais no lucrativo negócio de escamoteio de benefícios e tributos. A City de Londres e a circunspecta banca de Genebra som reputados especialista em artimanhas fraudulentas.

No entanto, os departamentos de Estratégia Corporativa, EC, e Responsabilidade Social Corporativa, RSC, das grandes companhias navegam em difícil equilíbrio tentando conjugar rentabilidade com reputaçom social. Casos como os de Edward Snowden e Julian Assange revelam os perigos de divulgar informaçom reservada. Afinal, secreto profissional que protege legalmente a operativa empresarial serve também para ocultar a discreta senda que conduz aos paraísos fiscais.

 

Notas

1 The Missing Profits of Nations, Abril 2022: https://gabriel-zucman.eu/files/TWZ2022.pdf

2 EUTAX Observatory: https://www.taxobservatory.eu/repository/the-missing-profits-of-nations/

3 https://missingprofits.world/

4 https://missingprofits.world/wp-content/uploads/2021/08/TWZUpdate.pdf

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